A CRISE NO SISTEMA DE ABASTECIMENTO DE
ÁGUA EM CANGUÇU - RS
Juliano
de Moraes de Aguiar[1]
RESUMO:
Trata-se
de um estudo de caso, em que é feito uma análise e caracterização dos
principais fatores que levam à escassez de água na cidade de Canguçu/RS. Para
isso, são avaliados os aspectos fisiográficos, como é o caso da hidrografia
local; se a gestão e os investimentos em melhorias e ampliação na captação e
distribuição de água, por parte do órgão responsável pelo abastecimento, são
ineficazes e insuficientes e; se devido as vocações econômicas agropecuárias do
município, as autoridades municipais, nas últimas décadas, não tiveram a devida
e necessária preocupação em aperfeiçoar e ampliar o sistema de abastecimento de
água em Canguçu.
PALAVRAS CHAVE:
Geografia
Econômica - Canguçu/RS, Água – Escassez, Água – Administração
ABSTRACT:
This is a case study, in which an analysis and characterization of the
main factors that lead to water scarcity in the city of Canguçu/RS is carried
out. To achieve this, physiographic aspects are evaluated, such as local
hydrography; if the management and investments in improvements and expansion in
water collection and distribution, by the body responsible for water supply,
are ineffective and insufficient and; Due to the municipality's agricultural
economic vocations, the municipal authorities, in recent decades, have not had
the necessary and necessary concern to improve and expand the water supply
system in Canguçu.
[1] Discente do Curso de Pós Graduação em Geografia da Universidade Federal de Pelotas, 2007.
Correspondência – Rua: Ernesto Manke, 87 – Bairro Triângulo – Canguçu/RS.
E-mail –
1 – A Problemática da Escassez de Água
em Canguçu
A água potável, atualmente, é vislumbrada como
um bem indispensável à manutenção da vida, não podendo, em hipótese alguma, ser
coibido o direito ao uso e gozo do líquido em seu estado natural, ou seja,
insípida, inodora e incolor, sob pena de infringência do princípio máximo
elencado na Carta Magna de 1988 que é o direito à vida.
Tendo em
vista o alto grau de dependência do homem ao recurso natural água e, a
freqüente problemática anual de estiagem com conseqüente desabastecimento de
água para a população no Estado do Rio Grande do Sul, principalmente, no
município de Canguçu, o objetivo deste trabalho é analisar e caracterizar quais
os principais fatores que contribuem para a escassez do líquido nessa cidade. A
muitos anos que a população reivindica melhorias e ampliação na captação e
distribuição de água para Canguçu. É comum entre os cidadãos apontar a escassez
de água como o principal fator criador de obstáculo ao crescimento e
desenvolvimento da cidade. Segundo os moradores locais, muitas indústrias
deixaram de se instalarem em Canguçu porque a cidade não fornece água em
quantidade mínima exigida para o funcionamento das indústrias e fábricas. A
falta d` água nessa cidade, além de dificultar a vida diretamente dos
moradores, cria outro problema social, indiretamente, ou seja, gera obstáculos
a criação de empregos e geração de renda que permita o desenvolvimento social.
Além de
identificar as principais variáveis que levam Canguçu a ter um abastecimento
ineficaz, foi dado ênfase na questão da averiguação de possibilidades e potencialidades de se
implantar projetos de ampliação e/ou analisar projetos existentes de melhoria
da captação, produção e distribuição do líquido na cidade, com o intuito de
contribuir para o esclarecimento e solucionamento do problema.
Em
síntese, dado a importância vital da água para a sobrevivência das populações
humanas e, a problemática do racionamento quase que anual do líquido na cidade
de Canguçu, o presente trabalho contribui para o fortalecimento de uma tomada
de consciência que tenda a conceber a escassez de água como um problema de
urgência máxima. E que, além disso, deve merecer das autoridades competentes,
da população e órgãos privados um cuidadoso processo de união de esforços no
sentido da ampliação da capacidade produtiva, da preservação dos mananciais
hídricos responsáveis pelo fornecimento de água e, do uso racional em
residências, instituições públicas, comerciais, etc.
Para a
obtenção de dados foram utilizados dois procedimentos: pesquisa documental e
pesquisa bibliográfica. Além dos dois procedimentos, também foi feito um
levantamento fotográfico nas represas para melhor ser visualizado o problema.
Por meio
da pesquisa documental foram extraídos dados de fontes primárias e secundárias,
tais como: dados bibliográficos, estatísticos, pesquisas e material
cartográfico, arquivos oficiais, registros em geral, etc; que foram o ponto de
partida para o prosseguimento da pesquisa, inserindo o trabalho dentro da
problemática estudada. Foram
visitados órgãos públicos e instituições que são competentes a produção de água
potável na cidade de Canguçu para a obtenção dos documentos necessários.
A revisão
bibliográfica foi muito importante para esta pesquisa, já que, teve como função
dar suporte e base para a interpretação dos dados, bem como, orientar possíveis
indagações. Foi por meio do confronto dos conhecimentos bibliográficos com os
dados levantados que, a análise e interpretação dos mesmos pode ser melhor
compreendida.
2
- Aspectos Geográficos e Hidrográficos de Canguçu
O município de Canguçu está localizado na
região denominada Serra do Sudeste, como parte do Escudo Cristalino Granítico
Sul Rio Grandense, de formação no Período Arqueano da Era Pré-cambriana
inferior, a cerca de 4,5 bilhões de anos, constituindo-se nos solos mais
antigos do Estado e do Mundo, por ser basicamente formado de Rochas Magmáticas.
Situa-se entre os Paralelos 30° 53’ 08” e 31° 40’ 20” de Latitude Sul e, os
Meridianos 52° 14’ 23” e 52° 59’ 06” de Longitude Oeste, possuindo uma altitude
de 420 metros na sede municipal. Onde se ergue a cidade Canguçu, registram-se
as maiores altitudes do município e da Serra dos Tapes, que dão ao local a característica de um nó orográfico
divisor de águas onde possuem nascentes os cursos d’ água que deságuam e formam
parte das bacias dos rios Piratini, a sudoeste; Camaquã, ao norte e, arroio
Pelotas e Lagoa dos Patos, a leste. A localização da zona urbana no ponto mais
alto do município é um fator determinante para a escassez de água, uma vez que,
as nascentes localizam-se muito próximas da cidade, onde os arroios tem uma
vazão relativamente pequena. Essa localização da cidade deve-se a um fato
histórico, explicitado por ( BENTO, 1983 ), em que, a antiga área escolhida para a zona urbana na localidade de Canguçu Velho, que tinha água em abundância
para uma grande população, foi substituída pelo atual local devido a fatores
políticos e religiosos, pois, a população se deslocou para o atual sítio urbano
atraída pela localização da Igreja Nossa Senhora da Conceição, que ali foi
instalada, devido a doação daquela faixa de terra para a Igreja, por dois
Sesmeiros que disputavam o local e, solucionaram o conflito desta forma.
A Hidrografia do município apresenta-se assim: dois rios com nascentes
em outros municípios e, diversos arroios que cortam o município nas diversas
direções, partindo das nascentes que ficam próximo a cidade, onde é o local de
maiores altitudes da Serra dos Tapes e, divisor de águas do município, para a
direção da Lagoa dos Patos, a leste e, as duas bacias formadas pelos dois rios,
ao norte e ao sul, conforme mapa da hidrografia do município.
Figura 1: Mapa da Hidrografia do Município de Canguçu
Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Planejamento e Urbanismo;
3 – A
Organização do Sistema de Abastecimento de Água
O abastecimento de água tratada e encanada em Canguçu, começou a vigorar em 1965, porém, desde cerca de 1960 já estava instalada na cidade a Hidráulica, antiga denominação da CORSAN.
A primeira barragem de captação utilizada
foi a da Olaria, que represa as águas do arroio da Olaria ainda no perímetro
urbano atual, no bairro Prado a cerca de 1 quilômetro do centro da cidade e,
tem um volume d` água estimado em cerca de 16.000 m3. Essa represa já existia
em forma de açude e era utilizada e aproveitada pela população para a retirada
de água antes mesmo da instalação da Hidráulica, devido ao fato de, as cacimbas
não abastecerem a todas as residências e secarem em épocas de estiagem. No
entanto, a represa fica localizada na cabeceira do arroio da Olaria ( Figura 4
) e, este, que já tinha capacidade de vazão reduzida, foi sendo aos poucos
afetado pelo crescimento da cidade de forma a ficar em um nível elevado de
assoreamento, encontrando-se, na atualidade, reduzido a um pequeno córrego,
como pode ser observado na ( Figura 2 ).
Figura 2 : Arroio da Olaria atualmente
Fonte: Elaborada pelo autor
Além disso, outro problema com relação a este reservatório
hoje, é a localização, que preocupa autoridades e a população. A represa da
Olaria já encontra-se situada dentro da cidade ( Figura 3 ), devido ao
crescimento da área periférica e, recebe despejos de esgoto que escapam das
tubulações próximas comprometendo a qualidade da água.
Figura 3:
Represa da Olaria no Bairro Prado
Fonte: Elaborada pelo autor
A cidade foi crescendo, no decorrer dos anos e, a demanda
pela água aumentando, desde muitas décadas passadas, em contraste com a
capacidade da represa da Olaria que foi diminuindo com o gradual processo de
assoreamento da represa e do arroio da Olaria de reduzida capacidade.
Foi aí que
atendendo ao princípio de melhoria e ampliação da capacidade de captação e
oferta de água e, a cláusulas de contratos que estipulavam esses princípios
como direitos dos cidadãos de terem mantido o acesso a água potável em
quantidade e qualidade mínima necessária, foi construída no início da década de
1980 e, inaugurada em 15 de março de 1984 a represa do Moinho. A barragem
recebe as águas do arroio Moinho e/ou Pelotas, a uma distância
consideravelmente pequena de sua nascente conforme ( Figura 4 ) e, possui cerca
de 3 hectares de espelho d` água, localizando-se a uma distância de cerca de 4
quilômetros ao nordeste do centro da cidade.
Figura 4: Mapa da hidrografia do entorno da cidade e da localização das represas
Com o assoreamento do arroio da Olaria e a construção da
represa do Moinho, a antiga represa da Olaria passou a funcionar como um grande
reservatório natural, já que o arroio da Olaria encontra-se quase extinto,
principalmente em épocas de estiagem. A água é transmitida da represa do Moinho
para a da Olaria por meio de uma estação elevatória composta por 2 grupos motor/bomba
de 100 Hp, com vazão média de 43 l/s e rede adutora de 200 mm de diâmetro,
sendo 2000 metros de ferro fundido e 1000 metros de cimento amianto. ( SEBRAE,
1999 )
Da represa da
Olaria a água é novamente bombeada até a ETA, localizada na Avenida 20 de
Setembro entre as ruas Cel. Leão Silveira Terres e José Albano de Souza no
Centro. Da Olaria até a ETA a água é bombeada através de estação elevatória e 2
grupos motor/bomba de 50 Hp, com vazão média de 40l/s e rede adutora de 150 mm
de diâmetro, sendo 966 metros de ferro fundido e 115 metros de cimento amianto.
( SEBRAE, 1999 )
As duas estações
reservatórios são acionadas por energia elétrica, devido ao fato de a cidade
localizar-se no topo da Serra dos Tapes e, portanto, estar numa altitude mais
elevada em relação as represas. Essa dependência da energia elétrica para o
bombeamento da água também gera transtornos, pois, em caso de falta de energia,
cerca de aproximadamente 2 horas depois, a cidade também fica sem água, por não
haver como bombeá-la das represas.
O sistema de
abastecimento da cidade de Canguçu é composto por 5 reservatórios de
armazenagem de água, conforme ( Tabela 1 ) e, possui uma Rede Geral de
Distribuição com comprimento de 59.829 metros, sendo, 51.300 metros de PVC,
5.700 metros de cimento amianto e, 2.829 metros de distribuição precária. (
SEBRAE, 1999 )
Tabela 1: Sistema de Armazenagem de Água de Canguçu, 1998
LOCALIZAÇÃO |
CAPACIDADE M3 |
N° DE ECONOMIAS |
% |
ETA |
500 |
2624 |
44,08 |
Vila do Céu |
250 |
1445 |
24,27 |
Vila Teixeiras |
50 |
1070 |
17,97 |
Centro |
10 |
214 |
3,59 |
Vila Nova |
250 |
600 |
10,08 |
TOTAL |
1060 |
5953 |
100 |
Fonte: BOEMEKE, L. R. S.
apud SEBRAE, 1999
Contudo, no
decorrer do processo de crescimento e evolução de Canguçu, assim como a represa
da Olaria deixou de atender a demanda de água, hoje, a represa Olaria e Moinho
juntamente já não dão conta de suprir as necessidades quantitativas do líquido,
principalmente nos períodos de estiagem do verão, o que, ocasiona a
problemática do racionamento de água na cidade.
Nos últimos três anos, em que o Estado do
Rio Grande do Sul foi assolado por severas estiagens, os moradores de Canguçu
convivem com os freqüentes racionamentos ocasionados pela escassez de água.
A CORSAN
trabalha com uma vazão média de 50 litros por segundo, o que, equivale a 180 m3
por hora. No entanto, a produção em períodos de estiagem é reduzida devido a
baixa no nível de água das represas.
Segundo a
CORSAN, durante o ano a demanda de água na cidade oscila de acordo com o
período e as estações do ano. No inverno, quando as estiagens prolongadas não
ocorrem devido ao aumento dos índices pluviométricos, a demanda na cidade gira
em torno de 2800 m3 por dia. Entretanto, no verão, quando as estiagens provocam
a baixa nos níveis de água das represas, o consumo aumenta para 3200 m3 por
dia.
Essa razão
inversa consumo/oferta de água, no decorrer do ano acarreta na escassez extrema
durante os períodos prolongados de estiagem no verão. Quando os níveis das
barragens atingem índices muito baixos, a CORSAN toma algumas medidas
emergenciais para equilibrar o consumo com a disponibilidade de oferta dos
reservatórios.
A primeira
medida dramática tomada pela CORSAN e, contestada pela população, é o
racionamento de água. Nos últimos três anos esta prática foi adotada para
minimizar a situação caótica de falta de água nos reservatórios. Os
racionamentos ocorreram nos meses de março/abril de 2004, março de 2005 e
fevereiro de 2006.
Nos anos de 2004
e 2005, a CORSAN adotou a prática de rodízio de setores de abastecimento. Nesse
sistema a água era fornecida durante 6 horas em cada bairro por dia. O sistema
não deu certo porque na periferia da cidade a água só chegava até as
residências nas últimas horas destinadas ao abastecimento daquele bairro devido
ao terreno acidentado e, as vezes não chegava, obrigando os moradores a
adquirir a água do caminhão pipa da CORSAN e gerando, divergências e
descontentamentos.
Já no período de
racionamento de 2006, de duração de 10 dias, a CORSAN adotou outra forma de
distribuição. Além dos caminhões pipas que distribuíam água para creches,
escolas e, também para a população, a cidade foi dividida em cidade alta e
baixa, de acordo com a topografia e, a água foi fornecida um dia para cada
parte, alta/baixa. O novo modelo visou distribuir melhor a água para todos os
bairros durante o racionamento evitando descontentamentos.
Além do corte da
água por meio do racionamento, a CORSAN também passa a não trabalhar com os
reservatórios cheios, para diminuir a pressão da água e o consumo em épocas de
estiagem. A produção diária em época de racionamento cai dos 3200m3 normais
para o verão, para 1300m3 à 2500m3. ( CORSAN, ETA/Canguçu, 2006)
Outra medida
emergencial feita, é o transporte de água bruta de açudes de propriedades das
imediações da cidade, para a Estação de Tratamento objetivando o
desabastecimento total. Além disso, a CORSAN represa córregos ( Figura 5 ) das
imediações da represa Moinho e, passa a bombear a água para dentro da represa
para ajudar a evitar a falta total de água, já que, poços artesianos foram
feitos, mas sem sucesso, devido a pouca água existente no subsolo granítico.
Figura 5:
Represamento emergencial feito em um córrego
Fonte: Elaborada pelo autor
As causas que
ocasionam a escassez e, o conseqüente racionamento de água em Canguçu, segundo
a CORSAN, são: 1) a estiagem; 2) os mananciais de pequeno porte; 3) a
construção de açudes na zona rural próximo as nascentes que afetam as represas
retendo boa parte da água que iria ser represada.
No entanto,
neste cenário de falta d’ água, ocorre uma situação definida a seguir que
contrasta com a realidade e, remete a busca pelas variáveis que levam a escassez,
ao questionamento das causas apontadas pela CORSAN. Trata-se de estimativas da
própria Concessionária, em que, constam dados de diminuição da demanda de água
na cidade no período de 2001 à 2006. Essa queda na demanda foi ocasionada,
provavelmente, segundo à CORSAN, pelo aumento da instalação de hidrômetros nas
residências que, passou de cerca de 40% de casas com o aparelho instalado em
2001 para aproximadamente 100% em 2006, o que, inibiu o consumo a partir da
emergência do ônus proporcional ao gasto, aliado, às melhorias nas redes de
canalização que reduziram perdas de água. Entretanto, mesmo com a diminuição da
demanda nos últimos anos, a escassez a os racionamentos de água aumentaram em
razão inversa ao consumo que diminuiu, fato que, põe em dúvida as explicações
dadas pela Concessionária à respeito do fator causador da escassez extrema de
água em Canguçu.
Ao analisar mais
profundamente o caso, verifica-se que a gestão da captação e abastecimento de
água para a cidade, feita pela CORSAN, tornou-se incompatível com as
necessidades da crescente população urbana canguçuense.
É sabido, que o
município tem a responsabilidade pela prestação dos serviços públicos
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão. Entretanto, os serviços de
abastecimento de água de Canguçu, são feitos pela CORSAN sob regime de
concessão da Prefeitura Municipal, mediante Contrato de Concessão de acordo com
a Lei Orgânica Municipal.
Sendo assim, as
responsabilidades pelo adequado fornecimento de água potável passam a ser da
CORSAN, uma vez que, através do contrato celebrado com o município, estão
dispostas cláusulas referentes aos direitos e obrigações da Concessionária, na
exploração dos recursos hídricos e na ampliação da captação e fornecimento de
água de maneira equilibrada, que atenda as necessidades da população e, que
gere a remuneração devida a Concessionária nos termos da lei.
O Contrato de
Concessão vigente, data de 1996 e tem validade de 20 anos. Neste, o município
de Canguçu concede a exploração dos serviços de abastecimento de água e, de
execução de obras de ampliação e melhorias dos respectivos serviços, da área
urbana de Canguçu, para à CORSAN.
Dessa maneira,
às obrigações da Concessionária estão explícitas na Cláusula Sétima, Incisos I ao
X do Contrato de Concessão de 1996. Essas obrigações, visam a atender algumas
necessidades da população e do município. Dentre as obrigações da CORSAN
destacam-se: ações que objetivem o equacionamento e o solucionamento, de forma
satisfatória, dos problemas referentes ao abastecimento de água; a garantia do
funcionamento adequado e da continuidade dos serviços que atendam ao
crescimento vegetativo da população, promovendo, para isso, as ampliações
necessárias de acordo com os objetivos e normas gerais dos planos oficiais de
saneamento e viabilidade econômica-financeira dos investimentos; estudos que
permitam enfrentar o sistema de saturação do sistema de abastecimento de água,
com data prevista para o ano de 1997. O município, fica obrigado pelo Contrato,
a participar com o percentual de 25% dos custos com obras de ampliação e
melhoria no sistema de abastecimento de água.
Contudo, hoje,
após cerca de 10 anos da firmação do Contrato, instalou-se um impasse entre a
Prefeitura Municipal e a CORSAN. Ficou claro, através da análise do Contrato de
Concessão, que a responsabilidade pelo adequado fornecimento de água na cidade
de Canguçu está a cargo da CORSAN. Porém, as obras de ampliação e melhoria no
abastecimento de água, de competência da Concessionária, são insatisfatórias e
não atendem às necessidades da população, segundo o Governo Municipal. Ademais,
a CORSAN não cumpre com o compromisso de melhorias e ampliação do
abastecimento, firmado no Contrato de Concessão de 1996, o que, levou a
Prefeitura Municipal a ingressar na justiça em setembro de 2005, pedindo a
observância às Cláusulas Contratuais por parte da Concessionária.
O sistema de
captação de água está saturado e, necessita de urgente ampliação para que os
racionamentos sejam erradicados da cidade. Segundo o Governo Municipal, desde a
construção da represa do Moinho, em 1984, que a CORSAN não investe
significativamente em melhorias e aumento da capacidade produtiva de água, o
que, levou o sistema de abastecimento ao atual colapso e ineficácia.
Atualmente, nem mesmo o desassoreamento das represas é feito para aumentar a
capacidade de acúmulo e, a retenção de água no inverno, com exceção do
reservatório da Olaria, que foi desassoreado no verão de 2006, provocando
polêmica quanto à época escolhida para a realização da obra, já que, a estiagem
estava prejudicando o município e, a qualidade da água foi alterada pela obra
segundo os moradores locais.
A represa do
Moinho, atualmente, também encontra-se assoreada ( Figuras 6 e 7 ), fato que
limita drasticamente a capacidade de acúmulo e retenção de água diminuindo o
volume total represado.
Figura 6:
Represa do Moinho de Canguçu
Fonte: Elaborada pelo autor
Figura 7:
Assoreamento na barragem Moinhos
Fonte: Elaborada pelo autor
Além de encontrar-se assoreada, a barragem Moinhos tem um
potencial que permite a execução de obras de ampliação da capacidade de
armazenamento. O local onde a represa assenta-se é apropriado para, por meio de
escavações, ser ampliado em largura e profundidade aumentando o volume
acumulado, tendo em vista que, a barragem está bastante afetada pela
sedimentação dos terrenos laterais que causam o assoreamento conforme ( Figura
7 ).
Além disso, um
relatório técnico do Laboratório de Mecânica dos Solos da Faculdade de
Engenharia Agrícola da UFPel, fez as seguintes observações a respeito da barragem Moinhos: ( Anexo do
Ofício 001/2006 GP, enviado pela Prefeitura Municipal ao Governador do Estado
em 02/01/2006 ).
1)
a bacia de captação da barragem Moinhos
possibilita o extravasamento de água durante o período de prescipitações
pluviométricas significativas;
2)
o arroio próximo a chegada à barragem
Moinhos mantém uma vazão mínima relativamente significativa, mesmo em períodos
de estiagem.
O extravasamento mencionado, é
facilmente perceptível no local, pois, na parte destinada a saída do excedente
de água, que pode ser visualizada na parte esquerda da ( Figura 7 ),
encontra-se um processo de grande erosão no arroio logo ao final da parte
pavimentada que, demonstra que em épocas de chuvas significativas, grandes
quantidades de água são desperdiçadas.
Portanto, é viável e aplicável a baixo custo um aumento
na capacidade de retenção da barragem, já que, o arroio Moinho possui vazão
significativa e suficiente e, a base da represa já está pronta, permitindo que
projetos de engenharia sejam adicionados para aumentar a capacidade da represa atual, melhorando a
curto prazo o problema da falta d` água na cidade.
Ainda como sugestão, o relatório anteriormente mencionado, propõe a escavação da barragem, próximo a ombreira direita de modo a preservar o cotovelo do arroio e, impedir a entrada de materiais em suspensão na captação da água. Esta proposta, também menciona que o material extraído pode ter outros fins, como por exemplo, pavimentação de vias, sendo portanto, ambientalmente correto por evitar a exploração de outros locais.
CONCLUSÃO
Em Canguçu, este trabalho identificou que
o problema com relação à escassez e falta de água, não é apenas atual, mas sim
histórico e, está atrelado ao próprio desenvolvimento da cidade.
Os aspectos geográficos demonstraram que,
o município de Canguçu possui recursos hídricos com potencial para abastecer a
toda a população, assim como, ao distrito industrial que encontra-se pouco
desenvolvido. A cidade, encontra-se cercada por vários arroios, localizados em
distâncias não muito grandes do centro urbano, assim sendo, este trabalho
comprovou que uma das hipóteses iniciais que antecederam esta pesquisa, de que
o município não dispunha de recursos hídricos com possibilidades viáveis de
captação e distribuição, não se confirma. Os arroios situados próximos a
cidade, principalmente o Moinho e/ou Pelotas, oferecem potenciais de aumento e
ampliação na capacidade produtiva de água na represa, assim como a construção
de outra represa ao longo de seu
curso, para abastecer não só a uma população superior a já existente na cidade,
mas também, a indústrias e fábricas que podem vir a instalarem-se no município
com a melhoria e ampliação da oferta de água.
A análise da gestão da água no município,
demonstrou que a captação e distribuição de água para a cidade, está sob a
responsabilidade da CORSAN por meio de um Contrato de Concessão celebrado com o
Município. Ao longo do texto, também foi exposto que a Concessionária não está
realizando um fornecimento de água de maneira adequada e, que atenda às
necessidades mínimas da população canguçuense. Assim como a represa da Olaria
deixou de atender a demanda de água no passado, hoje, a represa Olaria e Moinho
juntamente já não dão conta de suprir as necessidades quantitativas do líquido,
principalmente nos períodos de estiagem do verão, o que, ocasiona a
problemática do racionamento de água na cidade. A cidade cresce, a população
aumenta, enquanto que, desde 1984 quando foi inaugurada solenemente a represa
Moinhos, à CORSAN não investe maciçamente em melhorias e ampliação da
capacidade de represamento e captação de água para a cidade. Este fato, aliado
ao elevado nível de assoreamento da represa atualmente, confirma às premissas
iniciais desta pesquisa de que a Concessionária não investe o suficiente para
solucionar, de maneira equilibrada, os problemas referentes a escassez e falta
de água para a cidade de Canguçu.
No que refere-se ao
município, as primeiras ações para a melhoria no abastecimento de água, foram
tomadas quando da concessão dos serviços para a Concessionária Estatal,
cujo reconhecimento é tido em todo o Rio Grande do Sul. Além disso, as ações
que reivindicam o cumprimento do Contrato de Concessão pela CORSAN, tem sido
tomadas, chegando ao extremo de a Prefeitura Municipal ter que ingressar na
justiça reivindicando o cumprimento do referido Contrato. Essa divergência
entre CORSAN e município, aponta que este último está realizando o seu dever,
cobrando melhoras e ampliações no sistema de abastecimento de água da cidade.
Este fato, descarta as suposições iniciais anteriores à realização desta
pesquisa, de que, as autoridades municipais não estariam dando a devida atenção
para o problema da escassez e falta de água em Canguçu.
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THEODORO,
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dos Recursos Naturais. Rio de Janeiro: Garamond, 2002.
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